Tendo considerado, 3 capítulos do “Manual Estilos Pedagógicos de Internacionalização no Digital: da alfabetização ao ensino superior”, relativos à “A Internacionalização da Educação Superior no Século XXI: Desafios e Oportunidades”, elaborado por Daniela Farias (pp. 57 - 67); “A Prática Colaborativa para a Internacionalização dos Saberes”, elaborado por Edgar da Silva Gomes Andrea Borelli e Marcos Andrei Ota (pp. 169 - 180) e o capítulo que aborda os “Processos de internacionalização no ensino e na aprendizagem dos estudantes de ensino superior em contextos digitais” elaborado pela Professora Daniela Barros [pp.254 - 265], onde o conceito da Internacionalização em contextos educativos, é ampla e profundamente explanada. Apesar de ser um modelo longe de estar pronto, a internacionalização em contextos educacionais, apresenta-se como um processo que está em constante construção.
De acordo com Jane Knight (2020, p. 26) a internacionalização é definida como “o processo de integração de uma dimensão internacional, intercultural ou global na finalidade, nas funções ou na oferta de instituições e sistemas de educação”, que de acordo com os autores é considerada uma definição sobejamente reconhecida pela comunidade académica, ao tratar-se de um processo que integra uma dimensão internacional, intercultural ou global na sua finalidade, nas suas funções ou na oferta de instituições e sistemas de ensino (p. 59). Contudo, segundo Jane Knight há que distinguir internacionalização, transnacionalização e globalização uma vez que para a autora, não se trata da mesma coisa.Sendo que a Internacionalização remete à ideia de nação, referindo-se à relação entre diferentes nações e países. A transnacionalização, que apesar de associada à ideia de nação, acontece num contexto mais territorial e fronteiriço. Já o conceito da globalização, coloca-o numa dimensão global ou “o mundo todo”. (Knight, 2007 apud Farias, 2003, p. 59). Esta integração visa promover a construção de saberes críticos, fomentando diálogos que ultrapassam o “curto-circuito local” e posicionam estudantes e docentes como “cidadãos do mundo”, afastando-se das abordagens e compreensões meramente geográficas ou economicistas caducas.
Nos três documentos analisados, contata-se que a nível conceptual, os três apresentam a internacionalização como meio e não como um fim em si mesmo, apresentando-se como um vetor que vem qualificar o ensino, a pesquisa e a formação crítica, seja pela mobilidade transfronteiriça, seja por meio do currículo (Marcelino, 2021 apud Farias, 2003, p. 62) e metodologias de ensino e aprendizagem (Knight, 2007 apud Farias, 2003, p. 61), mais conhecida de internacionalização em casa ou "Internationalization at Home” (IeC). Apresenta-se o conceito de modo igual, através a internacionalização dos saberes como prática colaborativa que ultrapassa barreiras de tempo e espaço, usando ferramentas digitais para aproximar realidades políticas, sociais e económicas diversas, promovendo diálogos interinstitucionais e internacionais (Gomes, Borelli & Ota, 2023, p. 170). Já Daniela Barros (2023, pp. 255-256), enfatiza os contributos pedagógicos da internacionalização em contextos digitais, entendida como parte integrante do sistema universitário, não apenas como iniciativas pontuais, através de classes em colaboração; cursos divididos entre colegas de universidades de outros países do mesmo idioma ou não; palestras e conferências; participação em fóruns específicos dentro das disciplinas/curso; elaboração de materiais didáticos em conjunto; entre outros.
Quanto às ações desenvolvidas, quer tecnológicas, pedagógicas e organizativas, planeadas e implementadas para incorporar efetivamente uma dimensão internacional no processo educativo, para Daniela Farias (2023, p. 61-62), a internacionalização contemporânea pressupõe uma mobilidade académica (estudantes e docentes), as políticas de créditos (Bolonha), diplomacia do conhecimento, internacionalização em casa (IeC), via currículo e metodologias, sem exigir deslocamento. Já Gomes, Borelli & Ota (2023, pp. 174-175), aponta, como principais estratégias identificadas para as aulas em contexto digital, as oficinas Brasil-Polónia, os cursos de curta duração (Nanodegrees) com docentes de ao menos sete países, aulas remotas para alunos da Universidade de Varsóvia e recurso intensivo de videoconferências durante a pandemia. Por sua vez, Daniela Barros (2023, p. 256) aponta as classes colaborativas online, os cursos compartilhados entre universidades de diferentes países, as conferências, os fóruns temáticos, a elaboração conjunta de materiais didáticos, como principais estratégias de internacionalização para as aulas em contexto digital.
O diferencial do trabalho Daniela Farias (2023, p. 64), salienta a agenda dos países do Sul Global e a necessidade de decolonizar saberes, ao afirmar: “A interculturalidade proposta pela internacionalização só faz sentido a partir da inclusão de saberes e práticas e não ao contrário. Isso inclui saberes de todos os continentes e culturas” (Farias, 2023, p. 66), valorizando a interculturalidade como inclusão efetiva de múltiplas tradições epistemológicas.
Por sua vez, o diferencial em Gomes, Borelli & Ota (2023, p. 174), está em apresentarem a experiência formativa do discente, ao evidenciar através dos indicadores de satisfação (77,5 % de avaliação positiva) e relatos espontâneos que valorizam a diversidade cultural. E Daniela Barros (2023, p. 256), aborda em detalhe as necessidades de documentação e formação continuada para docentes (68,5 % dos inquiridos assinalam falta de manuais práticos) e elenca um quadro de boas práticas que relaciona elementos pedagógicos a ações institucionais (p. 264).
De uma forma geral, os três artigos assumem que a internacionalização fortalece redes/práticas colaborativas e enriquece o repertório didático-pedagógico. Além disso, reconhecem o papel central das TIC e das modalidades híbrida e online para viabilizar intercâmbios (exacerbado pela pandemia). E enfatizam a internacionalização como estratégia de inovação institucional, capaz de potencializar competências digitais e a cidadania global.
Mas também apresentam perspectivas específicas, enriquecendo e contribuindo para o leque diversificado de perspectivas perante o conceito da internacionalização em contextos educativos. Por um lado, a nível metodológicos Daniela Farias (2023, p. 66) aprofunda o debate conceitual, Gomes, Borelli & Ota (2023, p. 179) focam-se em narrativas de experiências e avaliações semestrais e Daniela Barros (2023, p. 259) estrutura um diagnóstico quantitativo-qualitativo de docentes.
Além disso, cada estudo situa, as suas iniciativas de internacionalização a nível geográfico. Por outras palavras, trata-se de mapear parcerias e contextos culturais-curriculares. E cada autor aborda diferentes contexto, nomeadamente: Gomes, Borelli & Ota (2023, p. 177) detalham parcerias Brasil-Europa-África-Américas, enquanto Barros (2023, p. 255) centra-se na rede lusófona; e Farias (2023, p. 64) contrapõe Norte/Sul Global.
Quanto à escala organizacional, cada iniciativa de internacionalização insere-se, num nível de ação que investiga políticas macro e fundamentos teórico-filosóficos da internacionalização, tocando em temas pertinentes, desde a descolonização dos saberes e da internacionalização a Partir do Sul Global, por Farias (2023, p. 64). A abordagem de Gomes, Borelli & Ota (2023, pp. 171-173) privilegia ações emergentes durante o período da pandemia e Barros (2023, p. 264) constata que a internacionalização no Ensino Superior deve ser entendida como um processo amplo e multifacetado, que vai muito além da mobilidade física.
Para conclui, a partir dos três textos, conclui-se que a internacionalização em contextos educativos é, simultaneamente, um processo intencional e multifacetado, que deve aliar concetualização sólida a práticas colaborativas sustentadas. Enquanto Farias fornece o arcabouço teórico e histórico, Barros apresenta as necessidades formativas e Barros e Gomes et al. evidenciam experiências concretas que orientam a aplicação prática desse conceito. Realizar um “internacionalizar em casa” robusto implica, assim, conjugar políticas institucionais, capacitação docente e envolvimento ativo de estudantes em comunidades globais de saberes.
Farias, D. (2025). “A internacionalização da educação superior no século XXI: Desafios e oportunidades”. In Barros, D. M. V. (Org.),“Estilos pedagógicos na internacionalização do digital: Da alfabetização ao ensino superior” (pp. 57–66). Lisboa. Universidade Aberta.
Gomes, E. da S., Borelli, A., & Ota, M. A. (2025). “A prática colaborativa para a internacionalização dos saberes”. In Barros, D. M. V. (Org.),“Estilos pedagógicos na internacionalização do digital: Da alfabetização ao ensino superior” (pp. 169–177). Lisboa. Universidade Aberta.
Knight, Jane (2020). “Internacionalização da educação superior: conceitos, tendências e desafios”. (2. ed). São Leopoldo, Oikos.
NOTA: Apresento aqui o texto (sem as notas de rodapé) e no link, o texto com as respetivas notas de rodapé.
"Se tratares um indivíduo como ele é, ele irá permanecer igual ao que é. Mas se o tratares como se fosse o que deveria ser, ele irá transformar-se no que deveria e poderia ser."
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Estimada professora Daniela, para lhe responder em relação à palavra ‘estagnar’, ela terá que estar associada à palavra internacionalizar. E creio ser esse o dilema que é amplamente abordado nos três capítulo do manual de Daniela Barros (2023), “Estilos pedagógicos na internacionalização do digital: Da alfabetização ao ensino superior”.
A interpelação subjacente que pude encontrar nos três textos, leva-me a constatar que, o futuro do ensino superior passa pela elaboração de um plano estratégico assente numa visão internacional e intercultural que não deve ser vista como acessória e lateral, mas sim essencial e prioritária para a qualidade do ensino, da investigação e para a formação do pensamento crítico ao longo percurso de desenvolvimento dos estudantes, ao longo da sua vida. Ao se internacionalizar o ensino, assume-se a transição digital como uma das prioridades mais relevantes neste setor público, evidenciados por documentos oficiais, como o Plano de Ação para a Transição Digital (PATD) (2022), o Documento da Unesco de 2024, que contém os 6 pilares para a transformação digital da educação ou o documento-guia das Metas da UE para a transformação digital até 2030, só para mencionar alguns.
Hoje em dia, as redes online, as aulas colaborativas e a co-docência à distância são fundamentais para a internacionalização. Práticas educativas que ampliam as habilidades didáticas e fortalecem laços globais. Basta constatar o nosso caso, enquanto alunos de Doutoramento, localizados em múltiplos locais geográficos e temporais.
A adaptação a esta urgência social, como é a transição digital, vem contribuir para o desenvolvimento científico-académico. Negá-la, é o mesmo que travar a estrutura curricular, aumentar as desigualdades de acesso, optando por um caminho rumo à estagnação e desproteger o cidadão de ideologias e inteligências. Negá-la, nem sequer será o mesmo que ficar parado, mas sim retroceder, estagnar e ficar preso a uma visão limitada e perder oportunidades de crescimento e influência, num mundo cada vez mais polarizado e politizado. Perante as ideologias impostas e ao alcance de um ‘click’, o contributo da internacionalização do ensino superior, contribuirá para a adoção de atitudes que questionem as hierarquias de saber e que permitam à integração cívica e académica nos debates globais importantes, estruturantes, de modo a torná-los mais plurais e mais multi, inter e intradisciplinares. Cabe a nós escolher: internacionalizar ou estagnar.
E aqui, as instituições têm uma enorme responsabilidade. Daniela Barros (2023, p. 259) aponta que 68,5% dos professores sentem falta de orientação e formação contínua para atuar em ambientes digitais internacionais, evidenciando que os "processos de inovação docente precisam de fundamentos que sustentem a aplicação com as experiências realizadas, sua recriação e aperfeiçoamento. Qualquer processo de inovação necessita desse aperfeiçoamento contínuo". Sem políticas que apoiem e reconheçam essas iniciativas, elas acabam se dispersando e as universidades perdem dinamismo – e o risco de estagnação volta.
E suma, o manual de Daniela Barros (2023) “Estilos pedagógicos na internacionalização do digital: Da alfabetização ao ensino superior”, coloca ao ensino superior um grande dilema, que não é só estratégico, mas moral, que é:
Que via tomar? Investir em práticas críticas de internacionalização (digitais, colaborativas e inclusivas) ou esperar que os currículos e métodos se tornem rapidamente ultrapassados num mundo cada vez mais conectado.
Quanto ao dilema moral, que é mais um dever do que um dilema do ensino - integral e não só o ensino superior -, que tem a função basilar de dar todas as condições ao ser humano, para fomentar em cada pessoa, a sede do saber para compreender e decidir, para construir um pensamento crítico, que entendo a competência identitária do ser humano, pois só assim se é livre. Não cumprir esta missão, o ensino deixa o indivíduo-cidadão, desprotegido das ideologias e das inteligências que proliferam.
Que seja cumprida, também na educação digital, a máxima de Goethe:
"Se tratares um indivíduo como ele é, ele irá permanecer igual ao que é. Mas se o tratares como se fosse o que deveria ser, ele se ira transformar no que deveria e poderia ser."
Bibliografia:
Barros, D. (2023). “Estilos pedagógicos na internacionalização do digital: Da alfabetização ao ensino superior”. Lisboa. Universidade Aberta.
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creio que "internacionalizar em casa" de forma crítica supõe repensar o currículo, as estruturas, a formação docente e as condições de acesso digital. Ao integrar o olhar decolonial, as experiências de colaboração já testadas e políticas claras de capacitação e reconhecimento, cria-se um ecossistema em que a IeC se converte num vetor real de cidadania crítica, redes colaborativas e sustentabilidade académica.
Como pude apresentar no meu trabalho, a internacionalização em contextos educativos é, simultaneamente, um processo intencional e multifacetado, que deve aliar concetualização sólida a práticas colaborativas sustentadas. Enquanto Farias (2025) fornece o arcabouço teórico e histórico, Barros (2025) apresenta as necessidades formativas e Barros e Gomes et al. (2025) evidenciam experiências concretas que orientam a aplicação prática desse conceito. Realizar um “internacionalizar em casa” robusto implica, assim, conjugar políticas institucionais, capacitação docente e envolvimento ativo de estudantes em comunidades globais de saberes multidisciplinares, onde todos os agentes se comprometam e se sintam protagonistas de uma cultura educativa global.
Contudo podemos constatar a partir dos capítulos analisados, que existem entraves recorrentes, nomeadamente, a distância entre teoria e sala de aula, a tendência para reproduzir assimetrias Norte-Sul, a dependência de financiamentos externos e a carência de métricas de longo prazo. Há ainda burocracias internas que não reconhecem atividades online e persistentes fraturas digitais que excluem parte do corpo discente.
Um bom ponto de partida que se apresenta acessível desde já, é a elaboração de um diagnóstico curricular que identifique lacunas de internacionalização, conforme proposto por Daniela Barros (2023, p. 259).
Além disso, conforme pude enfatizar no meu trabalho, é de suma importância, mapear parcerias e contextos culturais-curriculares (e disso foi exemplo a celebração do acordo para a criação de um os Polo de Cultura e Ciência (PCC), entre a UAB e o Município de Alfândega da Fé, que celebrámos aquando o FIEG 2025).
Cada autor, fosse Gomes, Borelli & Ota (2023, p. 177) que detalham parcerias Brasil-Europa-África-Américas, enquanto Barros (2023, p. 255) centrou-se na rede lusófona; e Farias (2023, p. 64) contrapõe Norte/Sul Global, apresentaram diferentes abordagens e propostas, consoante o contexto e o lugar de leitura.
Assim e reiterando o que afirmei, realizar um “internacionalizar em casa” robusto implica, assim, conjugar políticas institucionais, capacitação docente e envolvimento ativo e construtivo de estudantes em comunidades globais de saberes multidisciplinares, onde todos os agentes se comprometam e se sintam protagonistas de uma cultura educativa global e de rosto humano.
Espero ter contribuído para o debate...
Fico também a aguardar a tua chave de leitura acerca do modo como podemos consolidar prática de "internacionalização em casa" e como as implementar.
Obrigada!

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