A paz, corolário da segurança, é condição para a prosperidade e desenvolvimento e, nessa medida, é basilar às atividades humanas para a vivência em sociedade [1].
A educação para a Paz, situa-se no horizonte que une o “real”, tendo presente as prática já consolidadas nos sistemas educativos, e o “possível”, através das transformações sociais que visam construir sociedades mais justas, mais inclusivas e mais sustentáveis. Nas palavras de D’ Ambrosio (2001 apud Moreira, 2020, p. 3), “as dimensões múltiplas da paz, isto é, paz interior, paz social, paz ambiental e paz militar, (…) devem ser os objectivos primeiros de qualquer sistema educacional…”. Esta tríade, interioridade, convivência social e cuidado ambiental, ponta para uma educação capaz de moldar hábitos quotidianos que promovam a tolerância e a solidariedade, como salienta Pureza (2001, p. 16 apud Moreira, 2020, p. 3), “A paz só pode ser alcançada pelo comportamento quotidiano”.
Num mundo marcado por “…uma terceira guerra combatida «por pedaços» com crimes, massacres, destruições…"[2] “… responde-se com uma paz mundial feita também ela de “partes individuais”, de pequenos passos, de gestos concretos. Onde todos têm um papel, cada um tem uma responsabilidade […] o tempo atual não é tempo das meias medidas. Se existe um extremismo da violência, a este (…) responde-se igualmente com radicalismo, mas, de maneira estruturalmente diferente, ou seja, com o extremismo do diálogo! Um diálogo que requer o máximo de envolvimento, que é arriscado, exigente, desafiante, que mira a arrancar as raízes da incompreensão, do medo e do ressentimento […] um diálogo «baseado no acolhimento das pessoas, na compreensão profunda das suas escolhas, das suas ideias, valorizando a beleza, o positivo, o que pode ser comum, que pode criar vínculos” [3] [4]. Por ocasião da Jornada da Interdependência, Filadélfia em 2003, Chiara Lubich, fundadora do Movimentos dos Focolares, afirmava:
“Sem fraternidade, nenhuma pessoa é realmente livre e igual (…) a fraternidade pode dar um novo sentido à realidade da interdependência (…) pode estimular iniciativas e reconhecer as complexidades do nosso mundo (…) tira os povos do isolamento e oferece desenvolvimento aos excluídos (…) mostra o caminho para resolver pacificamente as diferenças (…) permite-nos sonhar e esperar uma comunhão de bens entre países ricos e pobres, já que a escandalosa desigualdade mundial é uma das principais causas do terrorismo.”
E em sequência é possível apontar âmbitos e significados, para reinventar a Paz, “em primeiro lugar empenhar-se até o fim no diálogo; realizar projetos políticos que não sejam condicionados pelos interesses de parte; abater o muro da indiferença e reduzir as desigualdades; promover uma cultura da legalidade; preocupar-se em proteger a criação (…) amar a pátria alheia como a própria, o povo, a etnia, a cultura alheia como as próprias“[5].
No preâmbulo da recomendação da UNESCO (2023, p. 3) [6], reafirma-se que a Paz “não exige apenas a ausência de guerra ou conflitos armados, mas requer também um processo inclusivo, democrático e participativo em que (…) o diálogo e a solidariedade sejam incentivados, os conflitos internos e internacionais sejam resolvidos através da compreensão e da cooperação mútuas”. E mais adiante, na alínea i) das definições e propósitos da recomendação, indica que uma "educação transformadora" envolve o ensino e a aprendizagem que reconhece e valoriza a dignidade e a diversidade dos alunos em contextos educativos e (…) motivam-nos e capacitam-nos para refletir criticamente, tornarem-se agentes de mudança e protagonistas do seu próprio futuro, permitindo a tomada de decisões e acções informadas a nível individual, comunitário, local, nacional, regional e global, nomeadamente (…) educação para a cidadania global, a educação para o desenvolvimento sustentável e a educação para os direitos humanos, entre outras, que apoiam a construção de sociedades pacíficas, justas, inclusivas, iguais, equitativas, saudáveis e sustentáveis (p. 6).
Na Recomendação sobre a Paz, os Direitos Humanos e o Desenvolvimento Sustentável (2024, p. 4):
“… considera que alcançar e manter a paz é um processo ativo que depende das acções diárias de todos e de cada um. Reconhece que o nosso mundo é cada vez mais complexo, interdependente e interligado e que, por conseguinte, a educação também precisa de ser multidisciplinar e holística para garantir o pleno desenvolvimento dos indivíduos e das sociedades.”
Esta ênfase a ação contínua reforça a ideia de que a educação não basta ser transmitida; ela deve ser vivida e aprendida em contextos comunitários e sociais, exercitando-se em projetos interdisciplinares que articulem o currículo formal e iniciativas não formais. Um exemplo concreto, é o Projeto Living Peace International que consiste num Programa de Educação para a Paz, em várias escolas, é lançado o “Dado da Paz”, cujas faces remetem a frases que incentivam relacionamentos pacíficos entre crianças e jovens. Além disso, diariamente, ao meio-dia, em todos os fusos horários, somos convidados às 12h, a fazer um “Time-Out” de um minuto de silêncio, oração ou reflexão pela paz, criando uma rede global de empatia e solidariedade [7].
Fortalecer o imperativo ético de ensinar o direito à paz como dever de todos, é a proposta deita pelo Papa Francisco I na Universidade de Bolonha (2017, p. 4)[8] e reforçada no Vademecum | Pacto Educativo Global (2019, p. 20) [9], qual invoca o ius pacis[10], como direito de todos a resolver os conflitos sem violência (…) nunca mais a guerra, nunca mais contra os outros, nunca mais sem os outros!” (p. 4). Este apelo sublinha que, entre o real e o possível, reside a vontade coletiva de sonhar e concretizar uma cultura de paz, nas salas de aula e além delas.
Susana Rocha Fouto da Silva (1400165)
Notas
[2] Homilia do Papa Francisco I, na Celebração Eucarística, presidida pelo Santo Padre no Sacrário Militar de Redipuglia, por ocasião do centenário do início da I Guerra Mundial, a 13 de Setembro de 2014. Homília na integra pode ser acedida em https://www.vatican.va/content/francesco/pt/homilies/2014/documents/papa-francesco_20140913_omelia-sacrario-militare-redipuglia.html
[3] https://www.focolare.org/pt-pt/category/senza-categoria-2-4/page/11/
[4] https://www.new-humanity.org/wp-content/uploads/2014/03/www.focolare.org_press_files_2015_04_20150422_Maria-Voce_Inventare-la-pace_IT.pdf
[5] https://www.focolare.org/pt-pt/category/senza-categoria-2-4/page/11/
[6] Recomendação sobre a Educação para a Paz e os Direitos Humanos, a Compreensão Internacional, a Cooperação, as Liberdades Fundamentais, a Cidadania Global e o Desenvolvimento Sustentável acessível em https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000391686_eng/PDF/391686eng.pdf.multi.page=3
[7] http://livingpeaceinternational.org/br
[8] https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2017/october/documents/papa-francesco_20171001_visitapastorale-bologna-mondoaccademico.pdf
[9] https://www.educationglobalcompact.org/resources/Risorse/vademecum-portuges.pdf
[10] ‘Direito da Paz’ em latim
Bibliografia
Moreira, D. (2020). "Educação Global - Educar para a Paz". Lisboa. Universidade Aberta
Myers, S. & Barber, B. R. (Orgs.). (2004). “The Interdependence Handbook: Looking Back, Living the Present, Choosing the Future” NewYork: International Debate Education Associaction. Acessível em https://libkoha.alfaisal.edu/cgi-bin/koha/opac-detail.pl?biblionumber=125716&query_desc=su:{Social+participation.}&utm
UNESCO. (2023). “Recommendation on Education for Peace and Human Rights, International Understanding, Cooperation, Fundamental Freedoms, Global Citizenship and Sustainable Development”. Paris. UNESCO. Acessível em https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000391686_eng/PDF/391686eng.pdf.multi.page=3
UNESCO. (2024). “Recomendação sobre a Paz, os Direitos Humanos e o Desenvolvimento Sustentável “. Paris. UNESCO. Acessível em https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000388330

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